O alerta das Presidenciais

É fácil identificar os velhos problemas, o difícil é trazer novas soluções para os velhos problemas.
Apesar do Professor Marcelo Rebelo de Sousa ter sido o grande vencedor das eleições Presidências do passado dia 24 de janeiro, existem algumas vitórias e derrotas escondidas nos restantes resultados eleitorais.
A luta pelo segundo lugar já vinha há muito a ser declarada entre Ana Gomes e André Ventura. Em termos percentuais venceu Ana Gomes, mas em contexto político a vitória foi claramente de André Ventura, que, desde que fundou o partido “CHEGA” em abril de 2019, tem aumentado em muito o número de apoiantes e simpatizantes. Na minha opinião, este fenómeno deve de ser analisado mais ao pormenor.
Desde o caso “Operação Marquês”, em que um ex-primeiro ministro (que tinha levado o Partido Socialista a um dos melhores resultados de sempre em legislativas) foi acusado de corrupção, que a crença e confiança dos portugueses no sistema democrático e nos seus principais partidos tem sido posta em causa. Desde então, essa descrença e desconfiança tem aumentado com o aumento de casos judiciais em que políticos e/ou ex-políticos são acusados de corrupção. Para alimentar ainda mais essa descrença, os profissionais de alguns sectores essenciais (segurança, saúde, etc.) têm exposto injustiças e falhas de sistemas públicos através das redes sociais e outros meios de comunicação social. No meio desta descrença e desconfiança, aparece um novo partido que se diz fora do sistema e que o seu líder “não tem medo de dizer as verdades” e expõe de “forma fria” as falhas dos sistemas nacionais (por exemplo, as falhas no SNS).
Como eleitores, temos tendência a procurar o voto em alguém que identifique os mesmos problemas que nós e em quem possamos confiar para demonstrar o nosso descontentamento no atual estado da democracia. Mas é também como eleitores que devemos de analisar ao cuidado os candidatos em quem votamos.
Quer na minha vida pessoal quer na profissional, nunca gostei de apontar falhas a ideias e/ou projetos sem que pensasse e apresentasse uma alternativa e um caminho que considerasse melhor. “Dizer as verdades” sem qualquer proposta de solução não traz nada de útil para a resolução de um problema, por vezes ainda o agrava. Foi com essa expectativa que assisti aos debates presidenciais – esperar encontrar alguém que trouxesse soluções para os problemas dos sectores públicos. Aquilo que vi em André Ventura foi um candidato presidencial a identificar os problemas dos sectores públicos sem qualquer proposta de futuro para esses problemas. Para além disso vi também um candidato a usar as características físicas de adversários como arma de arremesso, sem qualquer consideração pela liberdade da constituição e pela democracia.
É certo que a democracia não é um modelo político perfeito e, apesar de estar em experiência há largos anos, também tem falhas que devem de ser corrigidas com a ajuda de todos. Como elementos parte da sociedade e do funcionamento democrático devemos de identificar essas falhas e ajudar na sua resolução. Nem tudo é responsabilidade nossa, também os partidos do círculo democrático se devem adaptar e ouvir as propostas e as queixas de todos nós.
Muito mais haveria a discutir dos resultados destas eleições (por exemplo, os elevados valores de abstenção), mas esta é, para mim, a análise mais urgente. Devemos de ir mais além do que identificar problemas, é urgente apoiar visões e soluções viáveis e se possível, fazer parte delas. É fácil identificar os velhos problemas, o difícil é trazer novas soluções para os velhos problemas.
André Manuel Alves Dias