Cem anos de frutos de árvore de hospitalidade

 Cem anos de frutos de árvore de hospitalidade

Padre Aires Gameiro

Foi plantada, cresceu e deu frutos.

Falo do centenário da Casa de Saúde S. João de Deus no Funchal.

Foram muitos os que semearam, plantaram e regaram esta árvore até hoje levando-a a dar frutos de hospitalidade, saúde, consolação, bondade e sentido de vida.

Limito-me, hoje, a discorrer sobre um Irmão hospitaleiro coroado pelo martírio, o Beato João de Jesus Adradas (1878-1936) que inaugurou esta Casa de Saúde no dia 10 de agosto de 1924.

Além dele e do Superior Irmão Manuel Maria Gonçalves, participou na inauguração D. Antonio Manuel Pereira Ribeiro, Bispo do Funchal, o Superior Irmão Manuel Maria Gonçalves, o Cón. Manuel Francisco Camacho, alguns leigos católicos, Dr. João de Almada, Romano Santa Clara Gomes, Eduardo Antonino Pestana, Manuel Sardinha, e os sacerdotes P. Prudêncio da Costa, José Maria Antunes, o P. José Bernardino e Silva, e Frei Cláudio Pina e mais alguns Irmãos e vizinhos.

O Beato João Jesus Adradas entrou na Ordem em idade de maturidade em 1904.

Já sacerdote, estudava teologia e direito para se doutorar, e era capelão substituto no manicómio onde os Irmãos trabalhavam em Saragoza, Espanha, quando reconheceu que era chamado para Irmão de S. João de Deus e aceitou.

Exerceu várias funções como capelão e formador. Foi provincial de 1919 a 1925 da Província Hispano-Americana-Lusitana.

Nessa função escreveu um carta ao Bispo do Funchal em 1 de julho de 1922 a pedir licença para iniciar uma comunidade dos Irmãos que foi erecta em 10 de outubro desse ano.

Visitou a Quinta do Trapiche em 22 de fevereiro de 1923 e os Irmãos que aqui preparavam o solar da Quinta para receberem doentes.

No ano seguinte veio fazer a visita Canónica de 2 a 12 de agosto e inaugurou-a já com cerca de quarenta doentes.

Ao regressar a Lisboa realizou a visita canónica na Casa de Saúde do Telhal (Sintra) de 16 a 25 do mesmo mês.

Foi um hospitaleiro competentíssimo e santo.

Tinha grande capacidade organizativa, visão  promissora desta Casa  e doutros empreendimentos no Telhal, Espanha, México, Colômbia e Chile que visitou e de onde escreveu duas cartas  sobre as viagens de aventura arriscada que fez nestes países em 1924 (ver “O Beato…João Jesus Adradadas…”(Ed. Salesianas 2022).  

Fundou a Escola  vocacional (Seminário Menor) de Ciempozuelos, dotando-a de programas pedagógicos bem estruturados onde se formaram muitos Irmãos de S. João de Deus portugueses entre 1910 e 1921; promoveu a publicação de dois manuais de enfermagem, a construção dos edifícios modelares de S. José no Telhal (1920) e no Funchal (1930) e a Ergoterapia como método ocupacional de desenvolvimento e cura dos doentes.

Foi exímio na formação  dos Irmãos restaurando o Noviciado em 1921, no Telhal, suprimido pela República maçónica e foi ele mesmo Mestre de noviços  preparando os Irmãos  para a perseverança no espírito religioso e observância regular recomendada ao Restaurador da Ordem, S. Bento Menni, quando este foi enviado a Espanha pelo  Papa Pio IX e pelo Geral da Ordem Irmão José Maria Alfieri a restaurá-la, em 14 de Janeiro de 1867.

Ainda hoje,  se encontram nos arquivos da Província os compromissos suplementares da ata da profissão, assinados pelos Irmãos que professavam, em que se comprometiam a observar a vida religiosa “perfeitamente comum” na  obediência e na pobreza.

Podemos dizer  que o Irmão Beato João de Jesus Adradas foi pai espiritual do Fundar da Casa de Saúde S. João de Deus, no Funchal, pois o Irmão Manuel Maria Gonçalves  foi um dos que assinou este compromisso de que se conserva cópia no arquivo o da primeira profissão, 16.07.1908, e o da profissão solene em 8.12.1919 recebida pelo Provincial Irmão João de Jesus Adradas em Carabanchel Alto, Madrid.

Em 1936, este Irmão, estava bem preparado para selar a sua vida com o martírio quando todos os Irmãos a assistirem doentes em Ciempozuelos, foram presos; e ele, por não ser encontrado, informou-se depois do sucedido e foi dizer aos milicianos: “onde estiverem os meus Irmãos, aí estarei eu”.

E com eles ficou preso durante quatro meses, foi mestre, consolador e animador deles “nas palestras, retiros e confissões”.

Em 28 de novembro de 1936, junto com os 22 Irmãos foram levado e fuzilado em Paracuellos de Jarama, perto de Madrid.

Foi beatificado por S. João Paulo II no dia 25 de outubro de 1992 com outros 71 Irmãos, sendo fiéis à sua fé e hospitaleiros até ao fim, com a oferta da sua vida ao Pai como Jesus.

Os Irmãos preferiram aceitar a morte que renegar a fé ou abandonar a sua presença e cuidados aos doentes  mais pobres.

É uma bênção que esta árvore da Casa de Saúde S. João de Deus tenha dado tantos frutos nestes cem anos a favor de cerca de 42.000 (quarenta e dois mil) doentes assistidos, 40 mil saídos com melhora e uns 1500 falecidos (números aproximados).

Centenário da CSSJD, 10.08.2024/ Pe. Aires Gameiro

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