Os Professores quentes não morrem…
Mantenho na minha memória, como se fosse hoje, as aulas do Professor, Padre Manuel Antunes.
Não era um simples transmissor de informação, tão pouco um mestre, mas era um livro aberto ao saber, consigo nos arrastava nessa viagem intelectual e, na sua luminosa humildade, nos ajudava a mergulhar nela para sempre…
Das suas aulas saía cada vez mais deslumbrada, diria mesmo em êxtase filosófico, não fora a dor de braço por ter passado duas horas a escrever, ininterruptamente, tudo o que ele dizia. Era num tempo ainda sem fotocópias, os livros escasseavam, em Portugal tão pouco existiam.
Das suas palavras emanava uma paz, que nos convidava sofregamente, a querer saber mais, os horizontes rompiam-se, a clareza e a profundidade da sua mensagem projectava-nos num espaço sem fim, onde tudo fazia sentido, tudo se completava e tudo se admirava, num limbo de amor ao saber, aquilo a que muito modestamente Pitágoras terá chamado Filosofia, amor à sabedoria.
Com o P. Manuel Antunes não havia maus alunos mas, simplesmente, os que não conseguiam acompanhar o ritmo vertiginoso, abrangente e, quase alucinante, do seu muito saber.
Guiada pela simplicidade e grandiosidade das suas exposições orais, aprendi a deificar Platão, a admirar Aristóteles e a ter uma ternura, respeito e admiração pela mística socrática que, ainda hoje, são uma referência na tumultuosa agitação ética e política onde as nossas democracias se esforçam por não agonizar.
O seu exemplo acompanhou-me anos a fio, quando nas salas de aula, em cima do estrado que Deus haja, eu tinha a felicidade de poder ensinar os “mestres gregos” da mágica e dourada época de esplendor ateniense, dava por mim a fazer os mesmos gestos, a empregar as mesmas expressões e a dizer o que com este inolvidável professor tinha aprendido e gravado na mente e no coração.
A plenitude da minha alegria consistia em constatar que, durante a aula, os meus alunos nem se tinham mexido, tudo absorviam como esponjas ávidas da Verdade, do Bem e do Belo.
Recordo quando uma vez, muito timidamente uma aluna levantou o braço e me colocou a questão que bailava na sua curiosidade jovem e deslumbrada: – “ Professora, quando um dia for para o Mundo Inteligível e se cruzar com Platão o que lhe pergunta?
Eu exausta, desvanecida e deslumbrada refugiei-me numa outra recordação e parafraseei a expressão de Eça de Queirós, quando chegou a Coimbra e foi ver e ouvir o “ deus Antero” falar e encantar nas escadinhas da Sé: -“ ajoelhava-me a seus pés e assim permaneceria para toda a eternidade”
Num dos seus muitos pensamentos o Jesuíta Manuel Antunes dizia: “ A Geografia ensina-nos que há climas frios e climas quentes e suas variantes temperados, secas e húmidas”. Tomando minhas estas palavras, eu diria que há professores tão quentes que se gravam no nosso espírito e deixam uma marca muito forte de amor ao saber, revestido duma espiritualidade cristã, de que só as almas grandes são portadoras e mensageiras.