“Comecei desde cedo a ver o lado do treinador”

 “Comecei desde cedo a ver o lado do treinador”

É no campeonato Asiático, mais concretamente na Indonésia, que Bernardo Tavares, natural de Proença-a-Nova está a marcar “golos”. Campeão na época passada enquanto treinador do “ PSM Makassar”, Bernardo Tavares faz o balanço da última época e traça os objetivos para a próxima. O treinador, que gostava de voltar à Primeira Liga Portuguesa, analisa ainda o campeonato português. Bernardo Tavares está na grande entrevista do Jornal de Proença.

Jornal de Proença (JP) – Começamos pelo início… Como e quando é que começou esta paixão pelo futebol?

Bernardo Tavares (BT) – Desde pequeno que me lembro de ir a pé para a Escola Primária de Proença-a-Nova e levar sempre uma bola de futebol comigo. Quando fazia anos, ou no Natal, a melhor prenda que me podiam dar era uma bola de futebol. Sempre gostei muito de jogar. Desde cedo comecei a tentar corrigir os colegas da minha equipa na escola quando jogávamos ou até mesmo os miúdos do meu bairro. Desde que me lembro sempre gostei muito de futebol.

JP – Então o ser treinador sempre foi um sonho?

BT – Penso que ter tido a perceção que como jogador de futebol nunca chegaria à elite comecei desde cedo a ver, ainda como jogador, o lado do treino e do treinador. O que poderia ser trabalhado no treino e transportado para o jogo. Com o passar do tempo percebi que o treino se fosse bem trabalhado poderia ajudar e muito no jogo. Quando acabei o 12º ano decidi tirar a Licenciatura em Treino Desportivo de Alto Rendimento em Futebol já com o intuito de ser Treinador de Futebol. Durante o curso estive ao mesmo tempo a trabalhar em vários clubes e tive uma Escolinha de Futebol em Proença-a-Nova. Deu-me muito prazer poder ajudar miúdos a desenvolverem-se no Futebol e a poderem praticar esta modalidade em idades muito jovens, pois não havia em Proença na altura. Aproveito a oportunidade para dar os parabéns à ADC de Proença-a-Nova pelo excelente trabalho que tem feito, com os jovens e também pelos troféus conquistados esta época. Alguns desses jogadores passaram pela Escolinha e deixa-me muito feliz ver que continuam a praticar desporto e a ter sucesso na região.

JP – Atualmente está a treinar um clube na Indonésia. Todos conhecemos a “febre” do futebol e dos campeonatos europeus. Como é que se vive tudo isto pelo continente Asiático? Há muitas diferenças?

BT – Sim! Estou no PSM Makassar, o clube mais antigo da Indonésia (107 anos de existência). É um dos clubes com mais adeptos, num país de 280 milhões de pessoas (28 x Portugal) que adoram futebol e onde quase sempre os estádios estão cheios. Na Europa existem os principais campeonatos, que têm muitos adeptos a assistir e qualidade no futebol, e depois existem outros países europeus onde isso não acontece. Na Ásia isso também acontece, existem países com campeonatos onde a qualidade é inferior e não tem muitas pessoas a assistir aos jogos e outros países onde existem milhões de pessoas a assistirem como é o caso da Indonésia. Comparando com Portugal onde existem “os 3 grandes” aqui na Indonésia existem “14 ou 15 grandes”. Penso que a principal diferença entre a qualidade do futebol, na maior parte dos países europeus e da Ásia, é a formação de jogadores. Na Europa trabalha-se o jogador mais cedo e com mais qualidade do que na Ásia. E depois os vários contextos culturais e religiosos de cada país nem sempre ajuda a desenvolver os jovens atletas da melhor forma.

JP – A nível desportivo os campeonatos não são muito conhecidos na Europa. O que é que justifica isso? Dinheiro? Qualidade desportiva?

BT – Eu já trabalhei na Europa, na África e na Ásia. Tenho várias participações nas principais competições internacionais asiáticas, Liga dos Campeões da AFC e principalmente na AFC Cup, correspondente a Liga Europa no continente europeu. Como tenho estas várias participações, com clubes de vários países asiáticos, e também vários troféus conquistados por alguns desses clubes asiáticos, o meu mercado de trabalho neste momento é mais na Ásia pois tenho sempre procura por parte dos clubes nestes países. O que me permite ter melhores condições de trabalho e financeiras que não tenho por exemplo em Portugal. É totalmente diferente disputar uma prova internacional asiática e estar numa Primeira Liga de um bom país asiático do que por exemplo estar num campeonato secundário em Portugal com os vários problemas financeiros e logísticos que infelizmente a maior parte dos clubes tem. Na Indonésia existe qualidade desportiva. Há bons treinadores e bons jogadores com qualidade de elite europeia ou sul-americana. Alguns exemplos: o treinador do Persija (segundo classificado) é o alemão Thomas Doll que já ganhou vários troféus em clubes europeus e já foi treinador do Borussia de Dortmund da Alemanha. Treinador do Persib (terceiro classificado) é o espanhol Luis Milla que foi campeão europeu pela selecção Sub-21 da Espanha e também já treinou a seleção principal espanhola e outros clubes da Primeira Liga Espanhola. Existem muitos outros treinadores noutros clubes com excelentes currículos, existem vários jogadores internacionais de vários países europeus e asiáticos e até alguns que já passaram pelas seleções do Brasil. Tudo isto somado a mais os estádios cheios… e com a paixão de milhões de adeptos…

JP – Na última época foi campeão pelo PSM Makassar, um clube que há 23 anos não era campeão. Como é que caracteriza toda esta época?

BT – Na minha opinião foi “um milagre” o que conseguimos fazer na época passada. Na época anterior o PSM quase que descia de divisão. Os melhores jogadores saíram e quando eu assumi a equipa nenhum jogador da Primeira Liga queria vir para a nossa equipa pois éramos o principal candidato a descer de divisão. Ficaram no clube apenas os jogadores que praticamente ninguém queria. Eu fui para o clube, pois eles tinham ganho uma Taça da Indonésia em 2019, e depois com a situação do covid a sua participação na AFC Cup (prova internacional asiática correspondente a Liga Europa) ficou congelada e só agora na época 2022-23 é que participaríamos. Quando começámos a trabalhar em Maio de 2022 fizemos um trabalho de Scouting espectacular e conseguimos contratar bons jogadores na Segunda Liga da Indonésia. Jogadores estrangeiros e jogadores das academias que nos ajudaram a chegar aos quartos-de-Final da Taça do Presidente da indonésia, chegar à Final ASEAN da AFC Cup onde nunca nenhuma equipa da Indonésia tinha conseguido chegar até então, e conseguimos ganhar a Primeira Liga da Indonésia com 22 vitórias, 9 empates e 3 derrotas. Igualámos o recorde de mais pontos conquistados (75) e batemos o recorde de derrotas (apenas 3). Penso que o grande segredo foi termos escolhido bem os jogadores, definir bem a melhor estratégia para cada jogo de forma a poder potenciar os nossos jogadores de acordo com as suas características. O apoio dos nossos adeptos também foi muito importante pois eles estavam sempre com a equipa e a apoiar de princípio ao fim do jogo independentemente do resultado.

JP – Acredito que tenha ficado muito feliz pelo campeonato. Como é que reagiu às palavras e manifestações que recebeu das várias instituições do futebol português, dos portugueses em particulares dos proencenses a este seu feito? Estava à espera?

BT – Fiquei muito satisfeito por todas as mensagens que recebi pois não estava à espera do impacto que teve em Portugal. Já tinha ganho no passado outros campeonatos e outros troféus noutros países e não teve muito relevo em Portugal. Agradeço a todos os que me felicitaram um grande bem-haja para todos eles! O meu obrigado em especial à Câmara Municipal de Proença-a-Nova pelo voto de louvor que me foi dado.

JP – Como é que olha e avalia atualmente o campeonato português?

BT – Gosto muito do nosso campeonato português. Continuo a achar que existem muitos que com pouco conseguem fazer muito! Infelizmente o futebol português está a perder força no ranking europeu e espero que as equipas portuguesas possam conseguir melhores performances desportivas nas provas europeias. É aí que Portugal compete com os outros países e leva o nome além fronteiras. E quanto mais baixo for o ranking europeu menos clubes vão às competições de clubes europeias e menos dinheiro vem para os clubes portugueses. Penso que infelizmente, em Portugal, existe cada vez mais adeptos de clube e cada vez menos de Futebol e isso tem que ser trabalhado o mais rapidamente possível. Corre-se o risco de no futuro poder valer de tudo para se ganhar e o futebol tem que ser um desporto para convergir massas e não para divergir ou criar polémicas como vejo em Portugal.

JP – Sonha voltar ao campeonato português e treinar uma equipa da 1ª divisão?

BT – Gostava de ter uma oportunidade na nossa Primeira Liga, pois acho que já tenho currículo que mereça isso e tenho o Curso de Treinador UEFA PRO desde 2013. Mas sei que nem todos os treinadores poderão ter essa oportunidade. Tento viver o dia-a-dia e fazer o meu melhor. Só assim poderei evoluir e sentir-me realizado. Essa possibilidade não depende só de mim.

JP – Enquanto treinador: Ronaldo ou Messi?

BT – Os 2! Messi para mim é um génio, que nasceu para o Futebol, mas que só teve realmente sucesso no Barcelona, num estilo de jogo caracterizado pela posse de bola e onde sempre jogou na sua zona de conforto. O nosso Cristiano Ronaldo, porque tudo o que conquistou foi fruto do seu esforço, dedicação e muito trabalho. Ele passou por vários clubes, vários países e teve quase sempre sucesso, começou por jogar a extremo depois com o passar do tempo passou a jogar a Avançado Centro. É uma máquina de fazer golos e será sempre uma bandeira de Portugal em todo o Mundo!

JP – Perspectivas para o futuro?

BT – Neste momento continuo no PSM Makassar. Começámos o campeonato dia 1 de Julho, já tivemos a qualificação para a Liga dos Campeões da Ásia onde fomos eliminados no desempate de pênaltis, sendo que nas provas asiáticas iremos participar na AFC Cup. Esta será uma época muito complicada pois saíram alguns jogadores importantes e existem clubes que se reforçaram muito bem e que têm a possibilidade de terem orçamentos bem mais generosos que o nosso, o que permite melhores ovos para poderem fazer a suas omeletes. 

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