A pedra que cai no lago
Hoje, o Sol brilhou durante a maior parte do dia como se quisesse celebrar uma festa! Daquelas que não vemos a “olho nu”, mas que é celebrada quiçá dentro do nosso coração. Tive a ocasião de combinar uma caminhada com uma amiga. Tudo estava planeado para percorrermos a passo ligeiro os limites do aeroporto. Tudo se conjugava, pois teríamos a oportunidade de conversar sobre as coisas boas, as menos boas, aspetos circunstanciais, do presente e do futuro apelando e forjando a esperança nos nossos caminhos de vida. O teatro a que assistira no dia anterior, foi motivo de gracejos e risadas, pois a descrição que eu fazia a propósito dos atores intervenientes foi também acompanhada por gestos de interpretação das cenas escolhidas. A peça, uma comédia, foi encenada, produzida e representada pelos alunos do 12ºano. Como dizia no panfleto entregue à entrada, “Este espetáculo surge, da vontade de cada um ir mais longe e da alegria que encontram quando, em grupo, procuram fazer algo verdadeiro e que espelha as amizades que foram construindo ao longo de vários anos juntos” (…) e no meio de todas as tribulações, acontecimentos e muito estudo, surge algo que transcende o individual, que aponta para o alto e que deseja o bem de todos, sempre com sentido de missão que é inerente à inquietação do Homem”.
A certo momento a nossa conversa foi interrompida! Um casal e 2 filhos aproximavam-se! Um dos menores, meu aluno! “Esta é a minha stora de FQ”! O olhar espantado e ao mesmo tempo um ar recolhido por nos encontrarmos fora do contexto habitual. “Viemos ver os aviões”! disse o pai, demonstrando ao mesmo tempo, alguma vontade de ouvir comentários sobre o Diogo. Parabenizei os pais pelo filho que têm: “muitas interrogações durante a aula, raciocínios bem elaborados, boas conclusões e sempre com a pressa de ser o primeiro a dizer qualquer coisa, sobre as questões propostas.” “De vez em quando é preciso apertá-lo porque não faz o que deve” retorquiram. É adolescente! Respondi. A conversa continuou, chegámos até ao ponto de questionar porque é que os aviões sobem tão alto, sabendo que pelo porte são tão pesados!
Essa não foi a questão mais importante para mim, naquele instante! Sem especular sobre o assunto, vi o Diogo feliz, por se sentir acompanhado pelos pais e o irmão. A trivialidade de passar ali um momento em família, ver o mesmo, sentir o mesmo vento que soprava, assim como, ouvir o grande volume de som dos motores dos aviões, criava uma cumplicidade deveras familiar, à moda do “um por todos”! Obsessão em ser felizes? Creio que não! Mas com felicidade, que é o sentido que damos às nossas vidas. Oportunidade de educar é garantir a segurança do que o outro não sabe e, garantir a liberdade no que o outro é capaz de fazer.
Veio à minha memória um ponto do livro que me ajudou em tempos, a descobrir o valor divino das inúmeras realidades humanas:
«És, entre os teus, alma de apóstolo, a pedra caída no lago. – Provoca, com o teu exemplo e com a tua palavra, um primeiro círculo…; e este, outro… e outro, e outro… Cada vez mais largo. Compreendes agora a grandeza da tua missão?»
Caminho, 831
Este é o ponto que graficamente associo ao “efeito dominó” para descrever como é que o som chega a outro canto de uma sala. Este acontece quando é provocada uma perturbação, somente na primeira peça dominó. Ao que é transportado da primeira à última peça dominó, chamamos energia. Da mesma forma existe o efeito causado por uma pedra que cai nas águas calmas de um lago! Quando a pedra cai, há “transferência” de energia da pedra para a água. A energia do impacto da pedra na água obriga a que se propague em todas as direções, formando a primeira onda, depois a segunda e assim sucessivamente.
A primeira peça passa uma “informação carregada de conteúdo”: de informações e de emoções, de felicidade e de espanto, de cultura e de conhecimento, de virtudes e de beleza, de opções e de projetos de vida, a construção dos ideais … A primeira peça, os pais que ensinam a conviver, cultivar o bom humor; saber ouvir com o coração, compreender, saber exigir, impor limites, estar atentos, ensinar a fazer e não fazer por eles.
Na adolescência, a “perturbação” surge acompanhada de uma mudança hormonal, física, psicológica, até mesmo repleta de crises à procura de uma identidade. Está estampado nos seus rostos, o acompanhamento que os seus pais lhes dão! Nos meus alunos! Poderei ser eu uma boa perturbação? Creio que sim, mas de forma diferente, isto é, de forma mais distante que a dos seus pais/família, os verdadeiros educadores. Os mais responsáveis! Aqueles que podem gerir melhor essa carga de energia, que muitas vezes aparece com o sofrimento, com as dificuldades, as incertezas e cujo antídoto mais adequado é o amor. Sentir-se querido, amado e crescendo em autoestima com toda a liberdade e em idade, os nossos adolescentes poderão pedir: “Por favor, (Mãe, Pai) fala-me de amor!” *
*RAUSAS, Inès Pelissié du – Por favor, hablame del amor!,Palabra, Madrid, 2003 (a autora consegue reunir no mesmo livro a sua sabedoria sobre antropologia da sexualidade, enquanto filósofa, e a experiência de mãe de 4 filhos; é um livro fundamental para os pais, com muitas sugestões de como abordar os temas do amor e sexualidade com as filhas e os filhos, entre os 3 e os 12 anos)