O regresso às aulas num país de profissionais

 O regresso às aulas num país de profissionais
regresso às aulas num país de profissionais
João Paulo Marrocano

Setembro é tempo de regresso à escola.

     Em Portugal, só na segunda metade do séc. XX é que a instrução primária chegou a todo o país. Durante a década de 50 foram construídas cerca de 7000 escolas primárias. Foi em 1960 que a escolaridade mínima obrigatória se fixou em 4 anos e 7 anos depois em 6 anos de escolaridade. Porem, estudar para além do ensino obrigatório continuava vedado à maioria dos estudantes, fosse ele por motivos económicos ou sociais, ou por falta da própria oferta educativa.

     As únicas excepções resumiam-se ás escolas profissionais e industriais que tiveram o seu aparecimento ainda no séc. XIX para dar resposta ás necessidades da crescente industrialização, ou os seminários religiosos.

     Na sequência da revolução social saída da revolução de Abril, o ensino sofre uma transformação profunda. O acesso à universidade aumenta vertiginosamente, levando ao proporcional aparecimento de novas universidades e institutos politécnicos. O ensino religioso quase desaparece, transformando os seminários em edifícios desprovidos de vida. O ensino profissional foi estigmatizado e os seus alunos começaram a sentir-se um “parente pobre” da vida escolar, como consequência e salvo raras excepções, as escolas comerciais e industriais deixaram de disponibilizar formação técnica especializada e diferenciada.

     As forças armadas, tanta vez esquecidas, tiveram também durante muitos anos um papel fulcral na formação de técnicos intermédios altamente especializados. Rara é ainda hoje a empresa de dimensão superior que não tem nas suas estruturas de manutenção antigos marinheiros. Formadora de excelência em áreas como mecânica pesada, eletromecânica, fogueiros, operadores de caldeiras e tantas outras, teve um papel absolutamente indispensável no aparelho produtivo do país. Pela crescente desmilitarização do país, também esta valência foi perdida.

     Hoje, face à dificuldade sentida em encontrar emprego condigno por muitos jovens licenciados em áreas de formação que manifestamente cresceram de forma desproporcional ás necessidades e à reconhecida falta de trabalhadores qualificados em muitas áreas, o ensino profissional voltou a ser considerado.

     Acontece, que salvo raros centros de excelência, o ensino técnico passou a ser “usado” como uma solução para resolver os problemas das escolas e não os problemas da sociedade. Para os cursos técnicos são “empurrados” os alunos com manifesta dificuldade de aprendizagem ou completo desinteresse em estudar. Infelizmente, os decisores políticos continuam a achar que o trabalho técnico é tarefa para “gente menor” e que quem não consegue aprender razoavelmente matemática ou ciências conseguirá ser um profissional de sucesso. Assim, as escolas apresentam cursos de formação profissional em áreas tão dispares como informática ou costura, mecânico de motorizadas ou protecção civil, jardinagem ou mecatrónica, sem qualquer avaliação das reais necessidades das comunidades onde estão inseridas, sem qualquer critério e continuidade pedagógico e sem qualquer avaliação do resultado seu trabalho.

     Outra das vias do ensino profissional, a formação para adultos, merece uma análise profunda num país que nas últimas décadas gastou milhões e milhões de euros na tentativa de fazer de cada um de nós um profissional de excelência. O problema é que a formação foi muita vez, ou continua a ser, utilizada por políticos a quem interessam mais os números da estatística. Aumentar a percentagem de alfabetização ou “maquilhar” os reias números de desemprego, foram muita vez o verdadeiro objectivo, sem qualquer interesse pelo valor acrescentado que a formação deverá trazer à sociedade.

     Mas pior, num país com formação subsidiada para todos os gostos, a que os inúmeros programas quase sempre financiados por fundos europeus nos habituaram, todas as formações que são realmente interessantes profissionalmente ou legalmente obrigatórias, são SEMPRE pagas.      Especialmente na agricultura, temos hoje uma quantidade de formações obrigatórias, desde transporte de animais vivos, aplicações de produtos fitofarmacêuticos, operação de máquinas agrícolas, operação de motosserras, entre outros, esbarram sempre no elevado custo que o cidadão tem que suportar. Também nas aticvidades económicas em geral, continua sempre a recair sobre os investidores, particulares ou empresas, o custo das formações obrigatórias por lei. As financiadas, essas, continuam maioritariamente reservadas para quem fez do estudar o seu ganha-pão. A nível político, assiste-se hoje a um contraditório e perigoso combate ideológico. Por um lado, argumenta que as escolas do sistema de ensino normal devem ser publicas, mesmo que as privadas sejam mais eficazes, por outro, deixa para os privados tudo o que é formação profissional obrigatória para a economia que funciona

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