Há um Ditador em cada esquina

Democracia Representativa
Passadas duas semanas depois das eleições presidenciais, há duas reflexões que importa fazer. A primeira sobre os resultados. A segunda sobre as reações a esses mesmos resultados. A grande novidade destas eleições foi o aparecimento de um novo candidato assumidamente de direita radical, de discurso fácil, acutilante, perigoso, feito para o cidadão comum e a falar dos problemas que estes mesmos cidadãos comuns enfrentam no dia a dia.
Então, como é possível que apenas 46 anos depois da queda de uma ditadura um candidato de ideologia tão próxima de Salazar tenha tido 500.000 votos? A explicação talvez esteja no nível de decadência, podridão e corrupção da classe política e até socialmente influente na sua generalidade. A população saturada do estado a que o país chegou será facilmente influenciável e terá sido esse o verdadeiro motivo de tal votação.
Obviamente, André Ventura não é a solução para os problemas que a sociedade enfrenta, as soluções que apresenta não passam de dissertações vagas, algumas contraditórias entre si, sem sustentabilidade credível e em muitos casos dignas de um regime ditatorial. Mas será que a sociedade política com responsabilidade social está disponível para inverter o sucesso do CHEGA para impedir que atinja níveis de votação verdadeiramente preocupantes? Não, infelizmente não está. Os acontecimentos vindos a público em especial sobre a vacinação são a prova disso.
É de facto urgente combater a ideologia do CHEGA, mas NUNCA esquecendo aqueles que nos trouxeram até aqui. Não podemos também tolerar aqueles que se apressaram a questionar os resultados das eleições, por enquanto, a democracia ainda é o menos mau de todas as formas de organização civilizacional.
Não podemos combater o CHEGA e tolerar os “Malatos” que sem qualquer pudor expressam o seu ódio pelas escolhas democráticas do seu povo. Não podemos combater o CHEGA e tolerar os “Sousa Tavares” que não sabendo sequer quantos anos dura um mandato presidencial opinam sem pudor que há grupos de portugueses que deviam ser impedidos de votar porque votam tendencialmente á direita. Discurso exactamente igual ao de André Ventura sobre portugueses de bem. Não podemos combater o CHEGA e tolerar os autarcas e outros agentes activos na sociedade que não disfarçam o desagrado com os resultados eleitorais apurados no seu burgo mas que repetidamente fecharam os olhos às negociatas duvidosas dos seus amigalhaços. Estes são na verdade o maior perigo para a democracia, falta-lhes coragem para enfrentar a realidade e assumir a sua responsabilidade pelo estado a que chegou a nossa democracia.
Que ninguém esqueça que a página mais triste da história da humanidade começou com Hitler e Estaline de mão dada como irmãos gémeos.
João Paulo Marrocano