Há argilas e argilas: contextos!

 Há argilas e argilas: contextos!

Na linguagem dos geólogos que, como eu, se envolveram mais intensamente com os sedimentos e as rochas sedimentares, o termo “argila” (do grego argilós, a partir do étimo argos que significa branco, tendo chegado até nós através do latim argila) ocorre geralmente em três contextos diferentes.

1. Espécie Mineral

Espécie mineral (silicato hidratado de alumínio e/ou magnésio, do grupo dos filossilicatos) que podemos especificar usando o termo “argilomineral” como, por exemplo, a caulinite, a ilite, a montmorilonite, a palygorskite e outras.

Componente essencial dos argilitos, dos xistos argilosos e das margas, faz parte do cimento dos arenitos ditos argilosos; é essencial na composição mineral dos solos e na dos produtos de alteração das rochas, com são o saibro ou arena e a terra rossa.

As partículas cristalinas dos argilominerais são extremamente pequenas, no geral, inferiores a 0,004 mm, só visíveis ao microscópio electrónico. Quando puros, os argilominerais são brancos.

2. Argilito

Sinónimo de “argilito”, nome de rocha sedimentar argilosa que, além de argilominerais, contém quase sempre partículas muito finas de outros minerais (geralmente quartzo associado a quantidades menores ou vestigiais de mica e feldspato), pulverizados durante o transporte entre o local de origem e o de deposição ou sedimentação.

O argilito é um material coerente, quando seco, friável e facilmente riscado pela unha e plástico quando humedecido, tornando-se moldável. Desagrega-se em excesso de água, formando suspensões (barbotinas) cuja estabilidade depende das dimensões das partículas e das características físico-químicas do meio. Endurece pela secagem e consolida por acção do fogo, características que determinaram o seu uso em cerâmica, em todas as latitudes e ao longo de todos os tempos.

A expressão “argila comum” é usada para referir a matéria-prima da cerâmica industrial do barro vermelho (telhas, tijolos) e na loiça de barro artesanal. Nesta expressão, o qualificativo “comum” marca a diferença com outras matérias-primas argilosas, como são o caulino, a bentonite e a argila refractária.

Barro” ou argilito impuro é o termo popular dado a esta argila comum. Neste contexto, entende-se por impurezas os detritos, mais ou menos finos, de quartzo, feldspato, micas, óxidos e hidróxidos ferro e, ainda, matéria orgânica, que lhe conferem colorações respectivamente, avermelhada (hematite), amarelo acastanhada (goethite) e castanha escura a negra (húmus). O termo tem origem no latim hispânico barrum, e é equivalente ou próximo de outros como greda e mataca.

Na indústria extractiva, caulino é o nome dado ao argilito branco, essencialmente constituído por caulinite, praticamente destituído de óxidos de ferro, o que lhe permite permanecer branco após cozedura e ser usado como matéria-prima no fabrico de porcelanas. Conhecido e utilizado na China, desde a Antiguidade, o seu nome provém de Kao Ling, que significa montanha alta. Os ingleses chamam-lhe China clay, numa alusão nítida à importância desta matéria-prima no país do Sol Nascente.

3. Classe granulométrica

Classe granulométrica usada na classificação dos sedimentos terrígenos de diâmetro inferior a 0,004 mm. É nesta medida que, via de regra, esta componente detrítica acompanha os argilominerais formando com eles os argilitos. Tal acontece por razões de hidrodinamismo.

Em resultado da alteração e erosão das rochas em terra, nas regiões onde a chuva é um dos factores dominantes (de climas temperados-húmidos e quentes-húmidos), os materiais resultantes dessa erosão (calhaus, areias e argilas) são arrastados, pela escorrência, para os cursos de água que os transportam muitas vezes até ao mar. Os calhaus vão rolando no fundo, as areias saltitando e as argilas, lado a lado com o quartzo e outros minerais pulverizados, permanecem em suspensão.

À medida que os cursos de água vão perdendo força (capacidade de transporte ou competência) os calhaus vão ficando pelo caminho, as areias conseguem ir mais longe e as argilas, bem como as ditas partículas muito finas, avançam ainda para muito mais longe, acabando por se depositar conjuntamente.

Já foi dito em texto anterior, mas não é demais repetir que, na sistemática de Avicena (980-1037), a argila, no sentido de argilito, era classificada entre as terras, ao lado de outras classes (pedras, sais, metais, minerais fusíveis).

Este critério manteve-se até finais do século XVIII, estando bem exemplificado na sistemática de Bergman (1735-1884). É com base nesta classificação obsoleta que os ingleses a designam por earth (e os franceses por terre) e que nós ainda usemos o termo terra, com o significado de argila, em expressões como terra rossa, terracota, terra sigilata, terra fulónica, etc.

Notas:

Alteração deutérica – ou hipogénica, é a alteração ocorrente no interior da crosta, exercida sobre os minerais das rochas, por acção de:

  1. águas magmáticas residuais muito quentes (hidrotermais), dos vapores e dos voláteis associados;
  2. águas residuais do metamorfismo regional;
  3. águas meteóricas penetradas na crosta e, aí, aquecidas por efeito do grau geotérmico. O qualificativo deutérico (do grego deuterós, ulterior, secundário) alude à posterioridade dos minerais resultantes desse tipo de alteração, secundários relativamente aos minerais da rocha magmática, entendidos como primários. É exemplo deste tipo de alteração, a caulinização.

Argila refractária – Argila usada no fabrico de tijolos e outras cerâmicas resistentes ao calor.

Marga – Rocha sedimentar resultante da sedimentação conjunta de uma componente carbonatada (calcária) e de uma outra argilosa, em partes sensivelmente iguais. É a matéria-prima essencial do cimento com que se faz o betão.

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