Cortiço global: socialismo/capitalismo
Os aficionados pela ideologia socialista podem deplorar, os mais sensíveis podem sapatear e até chorar.
Os fanáticos talvez rilhem os dentes e soquem as paredes, mas o socialismo não tem exemplos de sucesso.
Do leste europeu ao Caribe multiplicaram-se as tentativas. Geraram muita privação, extinção da liberdade individual e religiosa e atraso.
Por que o socialismo não dá certo? Talvez a razão maior dos fracassos seja o autoritarismo inerente à tentativa de implantar utopias ideológicas, que acabam com a graça de qualquer um que não esteja no topo do poder.
Dá-se então o “Quem está dentro quer sair e quem está fora não quer entrar”. Sempre há os que relutam em admitir isto, mas algumas perguntas podem minar a resistência.
No tempo do Muro de Berlim, quem tentava fugir? Os ocidentais ou os que viviam na Alemanha Oriental?
A China chegaria onde chegou sem o capitalismo de Estado? Por outro lado, denunciar o fracasso da utopia comunista, ainda que reconhecendo algumas conquistas, não significa necessariamente a rendição incondicional ao capitalismo. É neste desvão que me encontro e não estou sozinho.
Há um fato inquestionável: se uma pessoa trabalha para si mesma certamente o fará, salvo raras exceções, com maior entusiasmo, dará mais de si e ultrapassará limites. Não ficará presa ao relógio, não achará ruim trabalhar em finais de semana ou noite adentro, se necessário, e zelará mais pelo que é seu.
O clássico exemplo é o uso coletivo de automóveis. Automóveis utilizados por várias pessoas desgastam-se bem mais do que se estivessem na mão de um proprietário.
O motorista cuida mais do seu carro do que de um veículo de uso coletivo. Por que é assim? Por apego ou egoísmo? Não sei, mas é um fato e contra fato…
A livre iniciativa, portanto, é muito mais efetiva que qualquer modelo comunitário, salvo os empreendimentos de benemerência.
Hospitais religiosos, por exemplo, com abnegados que se doam, geram resultados extraordinários com menores recursos.
Até Fidel Castro confessou isto na entrevista que concedeu a Frei Beto, aquele mesmo que alguns consideram dublê de padre.
O problema do capitalismo é que ele não resolve todos os problemas, como promete o sedutor discurso liberal e a propaganda.
O capitalismo gera riqueza como nenhum outro modelo mas, a par de suas inegáveis virtudes, também aprofunda mazelas e desigualdades sociais.
Se você tem dinheiro, poderá valer-se da melhor tecnologia para combater uma doença grave, por exemplo. Se for pobre, morrerá num leito cercado por recursos medievais.
Visto em pequena escala, o capitalismo traduz a oportunidade de alcançar uma vida melhor, o que não pode ser recriminado.
A produção de excedentes corresponde ao esforço despendido e tampouco pode-se inculpar alguém por produzir além do que necessita se, na outra mão, reputaríamos como incapaz ou preguiçoso quem não produzisse sequer para a própria subsistência.
Empresas familiares com poucos funcionários são um bom exemplo capitalista.
Quando empresas crescem muito passam a causar desigualdades consideráveis. Ao assumirem dimensão global – na ânsia de matar competidores e na ganância de conquistar mercados muito além de seus quintais,- acabam por inibir o surgimento de competências em países periféricos.
Eis um ponto de inflexão, que pode macular iniciativas elogiáveis ao chocar ovos de serpente.
Introduzidos no Brasil na década de 50, os fundos de investimento adquirem empresas mundo afora, sem qualquer motivação que não seja o lucro. Este é outro ponto no qual peço para descer do bonde.
Penso que beira a indecência um cidadão qualquer, seja um bom vivant em Palma de Mallorca, uma velhinha no Tenessee ou um capitalista em Israel auferir, sem trabalhar, ganhos do suor alheio.
Acho que se deve premiar mérito e esforço, não o oportunismo. Não me importo se acharem que esta visão é arcaica. Não estou preocupado em parecer moderno.
Fico a recordar “O Cortiço”, de Aluísio de Azevedo. João Romão domina a taverna, a pedreira e o próprio cortiço.
O sistema financeiro e o capitalismo global, ilimitados, produzem escravos modernos, sem o ônus moral explícito da escravidão.
A palavra investimento ganha foros de ajuda e ser explorado toma o nome de oportunidade.
Multiplicar empreendedores e não premiar rentistas pode ser o caminho para diminuir a famigerada exploração do homem pelo homem.