Como é que os residentes de regiões costeiras lidam com a subida do nível do mar?
Uma investigação realizada no Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-Iscte) informa sobre a forma como os residentes nas regiões costeiras lidam com as ameaças das alterações climáticas, nomeadamente a subida do nível das águas.
Com as consequências das alterações climáticas, as zonas costeiras estão expostas aos impactos negativos da subida do nível das águas, colocando em risco comunidades e habitats naturais.
No entanto, as consequências da subida do nível do mar não são imediatas, o que pode explicar por que razão as pessoas continuam a escolher viver ao longo da costa.
Durante o seu mestrado no Iscte, Natacha Parreira, sob a orientação de Carla Mouro, investigadora do CIS-Iscte, investigou como diferentes tipos de vinculação ao lugar estão associados às estratégias das pessoas para lidar com a subida do nível das águas no distrito de Aveiro, considerada uma das zonas costeiras de maior risco em Portugal.
Natacha Parreira e Carla Mouro explicam o conceito principal do estudo:
“A vinculação ao lugar é a ligação afetiva das pessoas a um determinado lugar, bairro, comunidade ou cidade, e está relacionado com o desejo de permanecer perto dessa área devido ao sentimento de segurança e confiança”.
O estudo foca dois tipos de vinculação a um local: um tipo tradicional e um tipo ativo.
O tipo tradicional consiste num sentimento de lugar “herdado”, mais associado à residência de longa duração numa casa de família e à resistência a deixar esse local.
A vinculação ativa está mais relacionada a um longo período de residência num local escolhido e a um envolvimento mais ativo com a comunidade e as instituições locais através da participação cívica ou de contribuições para o capital social.
“Quisemos explorar a forma como estas duas dimensões se relacionam com as estratégias das pessoas para lidar com a subida do nível do mar e como essa relação é afetada pela perceção de risco e pela eco-ansiedade”.
esclarecem as autoras
De acordo com Natacha Parreira, “a eco-ansiedade ou ansiedade climática pode ser definida como uma preocupação ou angústia persistentes face às ameaças e incertezas atuais e futuras associadas com as alterações climáticas”.
A investigadora afirma ainda que “como as pessoas variam na forma como lidam e se sentem em relação aos perigos da subida do nível do mar, é necessário compreender melhor os fatores cognitivos e emocionais que influenciam a escolha de diferentes estratégias”.
O estudo, que envolveu 197 habitantes do distrito de Aveiro, revelou que os residentes com uma vinculação ativa mais forte à sua localidade tendem a perceber maior risco de subida do nível do mar e reportar mais eco-ansiedade.
Estes residentes também eram mais propensos a adotar estratégias ativas para lidar com o risco, como a procura de informação, a tomada de medidas preventivas e o envolvimento em iniciativas comunitárias.
Por outro lado, não foi encontrado um efeito significativo relativo à vinculação tradicional, verificando-se apenas que os residentes que tendiam a percecionar menor risco e reportar menos eco-ansiedade também referiam adotar mais estratégias passivas, como a negação, o fatalismo e a resignação.
Os resultados indicam também que mesmo níveis reduzidos de eco-ansiedade podem motivar os residentes a adotar estratégias ativas para lidar com o risco, indicando que “A eco-ansiedade pode ser uma emoção moral que sugere quanto é que os indivíduos se preocupam com incertezas e problemas importantes, o que favorece atitudes de resolução de problemas.”.
Segundo a equipa de investigação, estes resultados “sugerem que os fatores emocionais e cognitivos desempenham um papel significativo na forma como os residentes respondem às ameaças das alterações climáticas”.
A equipa de investigação espera que as suas conclusões possam informar os decisores políticos e os líderes comunitários no desenvolvimento de estratégias mais eficazes para fazer face às ameaças das alterações climáticas, em particular nas regiões costeiras vulneráveis.
O Município de Aveiro tem desenvolvido várias iniciativas para minimizar o impacto negativo das alterações climáticas ao longo da costa.
Um exemplo é o Plano Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas de 2021, que foi disponibilizado ao público.
Para além de medidas de adaptação das infraestruturas para fazer face a eventos como as cheias, inclui outras como campanhas para a sensibilização e o conhecimento dos residentes sobre a sua exposição a fenómenos climáticos extremos e as consequências para a segurança de bens e pessoas.
No entanto, do ponto de vista das investigadoras, o sucesso dos procedimentos de adaptação e mitigação poderá depender em grande medida do apoio e da adesão das comunidades.
“Ao considerar os diferentes tipos de vinculação ao local e a sua relação com o risco percebido e as estratégias de resposta adotadas, os decisores políticos podem conceber políticas mais direcionadas e inclusivas que respondam às necessidades e preocupações de todos os residentes”.
concluem.
Pedro Simão Mendes, Comunicação de Ciência (CIS-Iscte)