Ventos supersónicos extremos medidos em planeta fora do nosso Sistema Solar
Amor que morre sem morrer
Ainda a guerra, mais feroz, insana. Um segundo 11 de setembro que cai num tempo já inflamado por uma guerra sanguinária no coração da Europa que não vê caminho de saída.
Tempo devastado pela desorientação, tempo apocalíptico em que se desvelam todas as contradições, todos os enganos que vem à luz, fazendo cair as máscaras necessárias àquela falsa consciência que preferiria o esquecimento.
Como atingir o termo de um processo que, chegado a um limite de expansão máxima, acabar por deflagrar naturalmente, deixando espaço ao novo em germinação.
Ser-se pacifista em tempo de guerra exige estar dentro do conflito quando se torna mais virulento. O ódio, quando se desencadeia, faz extravasar tudo aquilo que, acumulado desde há muito, se oculta na expetativa de irromper.
Força incontrolada que se alimenta de si própria, daquilo que roubou ao amor. Não tem raízes, mas alimenta-se do que incuba, pescando nos bastidores antigos da História onde a memória está desperta e tudo sabe sem nada esquecer. É um vento maléfico, chega de repente e destrói.
Estar dentro, abertos, mas firmes. Jesus diante de Pilatos. Mudo. O olhar vivo, ardente, diante da verdade nua, sem intermediações. Apenas dor, depois o grito: «Pai, porque me abandonaste?».
A verdadeira morte é ausência de amor. Horror da morte da alma, terror cego que se manifesta em atos cegos que matam o humano. Por trás do ódio está o amor traído: violência, injustiça, opressão. Ausência de amor, escuridão, morte que chama morte.
Ao repudiar a pura piedade que sempre brota das lágrimas ardentes do amor que ama, o ódio debate-se dentro do seu inferno como pássaro enlouquecido dentro da sua armadilha e de lá não sai porque está cego, surdo e mudo.
A morte do amor, o desfalecimento na alma da sua chama, produz a sua máxima negação que é o ódio. Conhecendo a ausência de amor, Jesus conhece a dor até ao fundo.
Estar no meio da contradição. Mudos no meio dos ventos do ódio até que a voz que preme na profundidade sai, rasga o inferno e avista a luz ao alto escancarada a ver, chorando lágrimas de pura piedade. Ressurreição.
O amor está sempre no meio, traficado e crucificado. Tudo suporta, nunca cai verdadeiramente, mas permanece onde existe o atrito incandescente do ódio que devasta e destrói. Permanece aí, vivo. Morre sem morrer.
O amor ardente e puro consuma-se no amor, regenera-se no milagre da pura piedade que carrega o peso do mundo, que assim não colapsa dentro do seu inferno fechado, incapaz de a receber.
Ao repudiar a pura piedade que sempre brota das lágrimas ardentes do amor que ama, o ódio debate-se dentro do seu inferno como pássaro enlouquecido dentro da sua armadilha e de lá não sai porque está cego, surdo e mudo.
Cego à beleza, surdo à palavra do coração, mudo porque incapaz de gerar ações criativas. Desesperado pela desesperação da morte: é a besta que sai do mar, dos bastidores, oculto recetáculo de tudo aquilo que não se quer ver.
Ao mesmo tempo é a besta que sai da terra, a besta que conduz à luz, no cenário do mundo, o quanto a besta que sai do mar oculta.
Leva-o ao descoberto com todo o poder do espírito enganador, o qual, só então, se torna soberano e ri como um possuído, crendo-se o único dono de tudo.
Permanecer nesse padecer é consumar, participar ao vivo. Mistério incarnado do Reino que se torna ação, pensamento, intuição, obra criadora que sempre conduz o tempo histórico nos alvéolos do tempo escatológico, impedindo a autodestruição
Mas precisamente enquanto as forças infernais creem triunfar, o coro dos anjos faz-se ouvir sobre a terra ensanguentada, levando a frescura da vida enquanto abraça a morte.
É o silêncio do Sábado Santo, quando os gritos do inferno se ouvem ao descoberto e calam-se, como os cães que ladram à lua mal surge o sol.
Estar naquilo que passa aderindo, levando, como faz o amor. Deixar-se consumar, escavar para acolher sempre mais vastamente sem renegar.
Estar dentro através desse misterioso padecer que chega através do Espírito no qual não há distância.
Permanecer nesse padecer é consumar, participar ao vivo. Mistério incarnado do Reino que se torna ação, pensamento, intuição, obra criadora que sempre conduz o tempo histórico nos alvéolos do tempo escatológico, impedindo a autodestruição.
São os canais abertos dos corações à escuta que permitem à luz, em cada tempo, de penetrar nas trevas, ao amor de conter o ódio, à vida de conter o poder abusivo da morte.
O Eterno, com a sua luz, tem sempre escancarado o grande cenário da beleza, no qual a alma sedenta pode encontrar alívio e não cair, tornando-se presa da escuridão.
*Antonella Lumini, In L’Osservatore Romano (título original: O poder abusivo do ódio), Trad.: Rui Jorge Martins, Imagem, Publicado em 21.10.2023