A Panóplia

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Lago do Viriato – Serra da Estrela

Susana Lanção

Tinha uns 7/8 anos quando fui a Serra da Estrela com os meus pais pela primeira vez.

Foi em pleno Verão. Paramos o  carro junto ao lago do Viriato e ali petiscámos. Presunto, queijo, pão, vinho e sumo para mim. Como dita a regra de um típico português. O relato da semana foi feito ali. Com o lago em plano de fundo e o meu pai encostado ao carro com um das mãos nos bolsos enquanto a outra gesticulava no ar. A minha mãe, ia entrecalando as respostas com a composição de todos os elementos que estavam naquela toalha. Apesar de aparentemente estar tudo no sítio. Enquanto uma miscelânea de assuntos foram abordados, eu afastei-me um pouco para ver melhor o que me circundava. Era tudo tão diferente para mim. 

Entretanto, um pastor passou por nós e cumprimentou-nos. Trazia a leveza no sorriso e um cansaço no rosto. Desde então, a serra tornou-se para mim num local para ver e principalmente ouvir.  

Anos mais tarde voltei sozinha ao mesmo sítio e, foi nesse momento, que tive a certeza do quão maravilhosa ela é. Há um bem estar em sermos só aquilo que somos. O meu fascínio nasceu nesse dia. 

Ali, o mundo não oprime ninguém. Os sons são escassos e bem definidos. Dançam entre si, criando uma melodia ainda mais perceptível se fecharmos os olhos. Uma peça de realidade sem bilheteira. Mas plausível mesmo sem haver um fim. Talvez plausível também por isso. O sol brilha mais e o vento não incomoda. Sabe bem. Não preciso de compor o cabelo porque o mundo ali, não oprime ninguém. 

A vista que se tem de um miradouro, seja ele qual for, havendo tantos na serra, só se pode tornar a meu ver, verdadeiramente lúcida e não efémera, se antes lhe conhecermos as entranhas. De que me adianta chegar lá acima e não conseguir identificar nada do que está cá em baixo? A não ser que saibamos ler e interpretar imagens ilustrativas nos placardes informativos que se situam ao lado dos miradouros. Ai sim, estamos safos. Será que sim? O que se sabe ou aquilo que adquirimos conhecimento no momento não deveria estar associado a algum tipo de sentimento mas sendo este proporcional a nossa curiosidade? Não é muito mais entusiasmante? O lago do Viriato vai-me sempre fazer recordar a minha mãe com o seu vestido azul, o meu pai cheio de estilo encostado ao carro, o primeiro contacto com o pastor sorridente e o momento da minha adolescência em que conheci o significado da palavra nostalgia. Quero com isto dizer que a Serra da Estrela não é apenas um conjunto de montanhas onde neva no Inverno. Ela é merecedora de visitas em todas a alturas no ano. Como se costuma dizer, as pessoas fazem os lugares. Este é também para mim um dos aspectos mais importantes. Sentir a serra como ela realmente deve ser sentida, é apreciar a sua beleza além da que se vê a partir dos tais miradouros. No fundo, a serra é uma paradoxo. A sua simples complexidade, gera em mim, não diria sabedoria para não parecer prepotente, mas sim uma capacidade de aprender e boa memória. Que vai resultar no mesmo mas parece mais humilde. Precisamos de estar atentos aos costumes e tradições, nomeadamente os pastores que mesmo sendo poucos, ainda existem. Ou os produtores de queijo mais velhos  que devido a não terem condições, já só lhes é permitido a produção para consumo próprio. São honestos e têm para muito para nos ensinar. Convivem com poucas pessoas e um só cumprimento que seja da nossa parte, terá um impacto positivo para eles. E para nós também. Irá fazer com que se sintam importantes, quando na verdade são mesmo! Eles fazem parte da alma da serra. Quanto a neve, essa vai existir sempre. Estes aspectos para mim, são as tais entranhas que referi anteriormente. Depois disto, podemos então contemplar com a mais precisa certeza, a beleza da vista que se tem a partir de um miradouro. Seja ele qual for. Aproveitando a corrente de ar para nos livrarmo-nos do cheiro a queijo que fica entranhado na roupa após uma visita ao comércio tradicional que existe nas Torres. E no fim do dia termos a certeza que proporcionamos a melhor qualidade às nossas memórias. 

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