A fundação “Russkiy Mir” ou Mundo Russo

 A fundação “Russkiy Mir” ou Mundo Russo

Russofilia e Russofobia

Pavlo Sadokha

O caso do centro de estudos russos não é isolado. Acontece em todo lado onde existe fundação “Russky Mir“.

Os dias em que estamos a viver não são tempos de normalidade mas sim de guerra na Ucrânia, na Europa e com um agressor perfeitamente identificado que é condenado no mundo livre e que tem pelo infame nome de Federação Russa.

O tipo de guerra a que assistimos tem o nome de “Guerra Híbrida” porque não só faz recurso a meios militares convencionais mas também faz uso da ciberguerra, da acção e guerras psicológicas com o empregamento do clássico uso de agentes de influência, agitadores e a chamada “V Coluna” na clandestinidade, até aos Media.

Mais de um ano após a invasão de grande escala pela Rússia à Ucrânia poderemos hoje descortinar um dos planos mais brilhantes do Kremlin que tem sido preparado, apetrechado e afinado, desde antes de 2014.

Com a criação e instalação de verdadeiras células adormecidas russas ou pró-russas na Europa e em geral no mundo livre para na hora de terem de ser activados poderem seguir as instruções ou tornarem-se repentinamente em verdadeiras plataformas de apoio humanitário e até alegadamente pró-Ucrânia, mas é sempre nos detalhes em que se encontra o diabo e isto na Academia.

No mundo do chamado livre pensamento aliado à bondade de espírito mas profundamente ingénuos leva-nos a estar perante terrenos férteis para as chamadas medidas activas que Moscovo terá para junto da sua audiência local, estudantes, académicos, cientistas, porque não políticos e até diplomatas e outros actores chave que compõem o todo do cimento da segurança nacional de qualquer Estado-membro da NATO ou da União Europeia.

Universidade de Sorbonne

Após este complexo preâmbulo falo-vos do caso da Universidade de Sorbonne, uma das mais prestigiadas e antigas universidades francesas, logo europeias, onde também o centro Russkiy Mir ou “Mundo Russo” assentou operações e passo a citar o artigo e denúncia publicada pelo Congresso Mundial dos Ucranianos, uma organização equiparada ao Conselho das Comunidades Portuguesas reconhecido e órgão consultivo do Ministério dos Negócios Estrangeiros:

«O Departamento de Línguas da Universidade de Sorbonne, em Paris, promove regularmente discussões com jornalistas e escritores franceses focados em livros sobre viagens na Rússia e em 22 de Março de 2023, a Sorbonne organizou uma discussão “A Chamada do Mar” com Cédric Gra sobre sua viagem ao Extremo Oriente russo, ao Mar Branco, aos Urais e a outras terras distantes. A cinco de Abril deste mesmo ano, foi agendada uma reunião com Jean-Louis Gouraud, autor de Paris-Moscovo a Cavalo: A Extraordinária Viagem de Jean-Louis Gouraud em que ambos os escritores expressaram abertamente nas suas obras simpatia pela Rússia e não mudaram a sua posição até agora, já em plena invasão terrorista em grande escala pela Rússia à soberania ucraniana.

artigo e denúncia publicada pelo Congresso Mundial dos Ucranianos

“Parece que os russos não querem compartilhar ou descortinar o seu mundo secreto, mas [compartilhar] é necessário e não apenas porque Putin decidiu assim. Sou a favor de ter centros culturais russos no exterior, mas para que isso aconteça, os russos devem ousar dizer: ‘Vejam como somos maravilhosos'”.

disse Cédric Gra em entrevista à publicação online moldava Ecology.md.

A obra de Jean-Louis Gouraud também não se limita à sua paixão pelas viagens a cavalo.

“Esta obra não é apenas sobre caminhadas, complexidades da profissão de cavaleiro e cavalos, mas também sobre amizade com maravilhosos russos que abriram a Rússia para mim, a sua história, cultura e arte e me inspiraram a fazer todas as minhas buscas e ações”.

diz Gouraud na anotação do livro

Ora segundo o Porta-voz do Conselho da Associação dos Ucranianos em França, Daniel Sztul:

por detrás de todo discurso pela paz está a propaganda russa consciente ou subconscientemente. Não devemos ceder à narrativa de que o governo russo é mau, mas que o público é bom. Os russos de hoje na sua maioria são os únicos a fazer tudo o que a Rússia está a fazer hoje, são coniventes“.

Para Sztul, apesar da posição claramente expressa das autoridades francesas e da sociedade civil no apoio à Ucrânia, há uma tendência de se  separar os conceitos da Rússia como um Estado e as pessoas que “não querem a guerra”.

“A Universidade Sorbonne é conhecida há muito tempo por sua russofilia, o círculo académico é outro daqueles onde a propaganda russa é ativa e altamente permeável. Sob o nome de humanismo, educação e cultura, o Kremlin está a tentar tornarmo-nos apoiantes ou mesmo parte do “Russkiy Mir” ou do Mundo Russo. Não vamos permitir que isso aconteça e vamos reagir”.

disse Volodymyr Kogutyak, vice-presidente da Associação de Ucranianos na França

A ONG “Associação dos Ucranianos na França”, fundada em 1949, concentra-se a preservar a herança espiritual e cultural da Ucrânia, moldando uma imagem positiva da Ucrânia e dos ucranianos.»

Voltamos a Coimbra.

Depois de grande polémica sobre o afastamento do professor russo Vladimir Pliassov do Centro de Estudos Russos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, não tardou uma onda de artigos de autores que defendem o representante da fundação “Russkiy Mir” em Portugal, uns por afiliação ideológica, outros por ego, ainda outros tantos por outro interesse, não surgindo ainda autores insuspeitos que poderiam acorrer em defesa do “agente russo” por comprometimento ou Kompromat, mas talvez por idiotice útil.

“MICE” Money, Ideology, Compromise e Ego são os principais substratos para o recrutamento pelos serviços de inteligência e o que distingue do funcionamento dos serviços de inteligência do mundo livre com os dos Estados autocráticos ou tendencialmente autoritários nomeadamente os do então Bloco de Leste é não ter limites nem olhar a meios para atingir os fins, pois também não há escrutínio.

Todos os autores que compuseram a “defesa” do russo em Portugal, que falaram da falta de democracia, alegando “perseguição e caça às bruxas”, mostraram um Pliassov inocente da propaganda russa mesmo que o próprio afirme “como qualquer pessoa normal, estou contra a guerra“, mas que depois é capaz de acrescentar também que a “guerra na Ucrânia começou depois do golpe de Estado, quando começaram a matar ucranianos [pró-russos] em Odessa e em Donbass“.

Isto não passa mais uma vez de um guião da velha versão de propaganda do Estado russo, que já vinha desde o início da agressão russa contra a Ucrânia.

Ao investigar a produção literária destes autores defensores de Pliassov, do “filho dilecto da Mãe Rússia”, nenhum destes autores alguma vez se pronunciou antes uma única vez sobre guerra na Ucrânia, e muito menos do lado dos ucranianos e de uma Ucrânia livre, soberana e independente. Ora aqui o padrão de alinhamento russo e claro ao Kremlin une estes arautos autores da defesa do agente Plissov.

Além disso, em resposta às acusações dos dois ativistas ucranianos, Vladimir Pliassov escreveu na rubrica “opinião” no “Público” a 17 de Maio de 2023 que “Não compreendo como é que acusações públicas sobre a alegada propaganda pró-Putin, em nada fundamentadas e claramente provocadoras, de dois cidadãos ucranianos que se designam “ativistas”, que desconheço, juntamente com comentários absurdos de um jornalista, conseguiram manipular tanta gente“.

Desde 2014 que fazendo recurso da monitorização intensiva por OSINT (Open Source Intelligence) é sabido que os ativistas pró-Putin e a própria embaixada russa em Portugal, realizou alguns meses antes de início da nova agressão massiva contra a Ucrânia uma limpeza geral dos conteúdos online e nas redes sociais que pudessem vir a comprometer a identificação dos seus agentes de influência e ou propagandistas que até podem nem ser nacionais russos e mesmo assim conseguimos encontrar e trazer a lume uma fotografia de 2017 publicada num vídeo produzido em 2019 e propagandeado na página do Russkiy Mir de Coimbra.

Professor Vladimir Pliassov com cantor russo Iosif Kobzon

Na fotografia vemos Vladimir Pliassov, à vontade e honrado a posar com o famoso apoiante de Putin, o cantor Iosif Kobzon, entretanto já falecido. Este também agente do Kremlin foi cônsul-honorário da auto-proclamada República de Donetsk, o seu nome integrou a lista de pessoas sancionadas pela União Europeia por apoiarem de alguma forma os separatistas pró-russos na Ucrânia e já foi uma das figuras sancionadas também pelos Estados Unidos da América. Kobzon desde 1994 que tentava obter um visto para ir para os EUA, mas que lhe é continuamente negado devido ao seu alegado envolvimento com a máfia russa.

Fonte: Obervador no artigo “Iosif Kobzon, o Frank Sinatra russo, entrou na lista de sanções da União Europeia

Para todo e cada ucraniano a figura do Iosif Kobzon simboliza a ideologia do genocídio contra ucranianos  e da corrupção e neste sentido surge uma pergunta carregada de suspeição, pois os defensores de Vladimir Pliassov em Portugal, também conheceram este personagem mafioso e terrorista pró-Putin, Iosif Kobzon, pessoalmente?

A sociedade portuguesa que se tem mostrado tão generosa e sempre tão moderada e ingenuamente inocente tem de entender de uma vez por todas que os tempos que vivemos são excepcionais e de guerra e que a ofensiva russa não tem lugar apenas no campo de batalha na Ucrânia mas também nas mais insuspeitas e decentes instituições e de renome não só em Coimbra, mas também em Paris, entre outras capitais europeias.

O sistema de propaganda russa tenta neste momento mitigar ao máximo os efeitos de uma opinião pública contrária e ao mesmo tempo que se procura vitimizar-se apelando não à racionalidade mas ao sentimento ou emoções dos mais incautos e ingénuos das consequências reais da propaganda e medidas activas russas em Portugal, na Europa e no mundo.

Da desmontagem da narrativa russa sobre a “RUSSOFOBIA” no Conselho de Segurança da ONU

O Professor de História da Universidade de Yale e habitual académico visitante em Portugal realizou recentemente um depoimento no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas a apontar que o termo “Russofobia” não é mais do que uma tentativa da Federação Russa para justificar crimes de guerra na Ucrânia.

O mal que está a ser causado aos russos e à cultura da Federação Russa é em primeiro lugar devido às próprias políticas e acções, causando nomeadamente um êxodo de criativos russos devido à invasão russa à Ucrânia, destruindo ainda o jornalismo independente russo, com frequente censura russa na cultura, livros, museus e outros marcos, para não mencionar nos massacres aos próprios falantes e de cidadãos russos às grandes proclamações dos canais estatais de televisão.

A acusação de que os ucranianos são doentes com a doença chamada “Russofobia” é simplesmente uma retórica colonial e parte de uma estratégia de discurso de ódio alargado por parte da Federação Russa.

Na mesma sessão o Embaixador da Ucrânia frisou que as valas comuns em Bucha, Mariupol, Izium e noutros locais demonstraram o poder da propaganda de guerra de Moscovo em desumanizar os ucranianos.

Este sim segundo o Representante da Ucrânia é o verdadeiro ódio e discurso de ódio alimentado durante décadas, direccionadas contra a Ucrânia, e resultando em crimes de guerra, crimes contra a humanidade além de dilacerar a soberania do País.

Sobre isto, o futuro tribunal será estabelecido para julgar e levar à responsabilidade todos os que deram ordens criminosas e aqueles que as acataram e todos os outros que branquearam.

*Pavlo Sadokha, Presidente da Associação dos ucranianos em Portugal, Vice-presidente do Congresso mundial dos ucranianos na Europa,

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1 Comentário

  • […] contexto da guerra na Ucrânia, a opção da reitoria da UC foi a de cessar o protocolo com a Fundação Russkyi Mir – Fundação criada por Vladimir Putin em 2007, sancionada pela Comissão Europeia por constituir […]

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